Considerações sobre a chamada “MP do Contribuinte legal”
Em 17 de outubro de 2019, foi publicada no Diário Oficial da União a Medida Provisória 899/19, também denominada de “MP do Contribuinte Legal”, que tem por objetivo estimular a regularização de débitos fiscais e de conflitos entre contribuintes e a União Federal, de forma rápida, com a transação tributária na cobrança da dívida ativa da União e no contencioso tributário.
Em suma, a referida MP do Contribuinte Legal visa à regulamentação do instituto da “transação tributária”, prevista no Código Tributário Nacional (“CTN”), conferindo poderes à União para transacionar em matéria tributária e aduaneira dentro dos ditames dos princípios da isonomia, da capacidade contributiva, da transparência, da moralidade, da razoável duração dos processos, da eficiência e da publicidade, resguardando as informações por sigilo.
Referida norma também estabelece os débitos passíveis de transação, quais sejam:
- os créditos tributários não judicializados sob a administração da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (“RFB”) do Ministério da Economia;
- débitos inscritos em dívida ativa e os tributos da União, cuja inscrição, cobrança ou representação incumbam à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional; e
- no que couber, débitos inscritos em dívida ativa das autarquias e das fundações públicas federais, cuja inscrição, cobrança e representação incumbam à Procuradoria-Geral Federal e aos créditos cuja cobrança seja competência da Procuradoria-Geral da União.
Por conseguinte, determina as seguintes modalidades de transação: (i) a proposta individual ou por adesão na cobrança da dívida ativa; (ii) a adesão nos demais casos de contencioso judicial ou administrativo tributário; e (iii) a adesão no contencioso administrativo tributário de baixo valor; as quais dividimos em dois seguimentos:
Transações na cobrança da dívida ativa:
A transação na cobrança de débitos inscritos em dívida ativa poderá ser proposta pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, de forma individual ou por adesão, ou por iniciativa do devedor, ou pela Procuradoria-Geral Federal e pela Procuradoria-Geral da União e poderá dispor sobre:
- a concessão de descontos em créditos inscritos em dívida ativa da União que, a exclusivo critério da autoridade fazendária, sejam classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação, desde que inexistam indícios de esvaziamento patrimonial fraudulento;
- os prazos e as formas de pagamento, incluído o diferimento e a moratória; e
- o oferecimento, a substituição ou a alienação de garantias e de constrições.
Não será permitida a transação que envolva:
- As reduções dos valores do principal, devendo ocorrer sobre as parcelas acessórias da dívida (juros, multas, encargos);
- multas criminais nem multas decorrentes de fraudes fiscais; e
- Os créditos do Simples Nacional, do FGTS e não inscritos em dívida ativa.
Por conseguinte, a proposta de transação deverá observar os seguintes limites:
- Quitação em até 84 meses, contados da data da formalização da transação;
- Redução de até 50% do valor total da dívida, que pode aumentar para até 70% no caso de pessoas físicas, micro ou pequenas empresas; e
- Possibilidade de concessão de moratória – carência para início dos pagamentos.
Os créditos abrangidos pela transação somente serão extintos quando integralmente cumpridas às condições previstas no respectivo termo.
Em caso de rescisão da transação implicará o afastamento dos benefícios concedidos e a cobrança integral das dívidas, deduzidos os valores pagos; bem como autorizará a Fazenda Pública a requerer a convolação da recuperação judicial em falência ou a ajuizar ação de falência, conforme o caso.
Transações no contencioso tributário:
A transação no contencioso tributário por adesão será proposta mediante edital a ser expedido pelo Ministro de Estado da Economia e tem como objetivo pacificar litígios que versem sobre relevante e disseminada controvérsia jurídica tanto na esfera administrativa como judicial. Na prática, referida transação vai depender de concessões entre o Fisco e os devedores.
Quanto aos limites nas condições de negociação da transação:
- Necessariamente por Edital, que conterá as teses abrangidas pelas transações no contencioso tributário e as condições para adesão;
- Não poderá contrariar decisão judicial definitiva; e
- Não autorizará a restituição de valores já pagos ou compensados.
Por conseguinte, o sujeito passivo que aderir à transação deverá:
- Renunciar a quaisquer alegações de direito, atuais ou futuras, sobre as quais se fundem ações judiciais, incluídas as coletivas, ou recursos que tenham por objeto os créditos incluídos na transação, por meio de requerimento de extinção do respectivo processo com resolução de mérito;
- Requerer a homologação judicial do acordo (para fins do disposto nos incisos II e III do caput do art. 515 da Lei nº 13.105, de 2015); e
- Desistir das impugnações ou dos recursos administrativos que tenham por objeto os créditos incluídos na transação e renunciar a quaisquer alegações de direito sobre as quais se fundem as referidas impugnações ou recursos.
Ou seja, as transações no contencioso tributário somente serão celebradas se constatada a existência, na data de publicação do edital, de ação judicial, embargos à execução fiscal ou recurso administrativo pendente de julgamento definitivo, relativamente à tese objeto da transação.
Por fim, ressaltamos que a referida MP possui força de lei e começa imediatamente a produzir efeitos tão logo é editada, com eficácia de 60 dias, prorrogáveis, uma única vez, por igual período (ou seja, 120 dias no máximo). Porém, para que a MP mantenha sua eficácia, deverá ser convertida em Lei pelo Congresso Nacional dentro de 120 dias.