A Flexibilização da Lei nº 11.101/05 frente à Covid-19: A Nova Recomendação do CNJ
O plenário do Conselho Nacional de Justiça (“CNJ”) aprovou a Recomendação nº 63/2020 para que os magistrados com competência para o julgamento de ações de recuperação judicial e falência adotem medidas para a mitigação do impacto decorrente da Covid-19.
O objetivo é a continuidade da atividade empresarial, geração de tributos e manutenção dos postos de trabalho – elementos estes que, em conjunto, são essenciais para a efetividade da preservação da empresa.
A Recomendação aprova as sugestões dos estudos elaborados pelo Grupo de Trabalho criado pelo CNJ, por meio da Portaria 162/18, presidido pelo Ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça, cujo objetivo é promover debates e estabelecer medidas para dar maior celeridade, efetividade e segurança jurídica aos processos de recuperação judicial e falência.
A primeira medida consiste em priorizar os pedidos de levantamento de valores nos autos de processos de recuperação judicial, em favor de credores ou de empresas recuperandas. Trata-se de uma medida de evidente caráter econômico, de modo a garantir a célere liberação dos valores depositados em juízo para seus respectivos titulares, promovendo tanto o aquecimento da economia, quanto o favorecimento individual da parte. A circulação de recursos torna-se uma questão prioritária nesse momento.
Em consonância com todas as orientações sanitárias acerca da necessidade de distanciamento social, a segunda medida constante da Recomendação é a suspensão da realização de Assembleia Geral de Credores (“AGC”) presencial. Caso verificada a urgência da realização da AGC, esta poderá ser realizada virtualmente, ficando sob a responsabilidade do Administrador Judicial sua organização.
Recomenda-se, ainda, que o magistrado prorrogue o prazo de suspensão do curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor (stay period), quando houver necessidade de adiamento da AGC e até que seja possível a decisão sobre homologação (ou não) do quanto deliberado no conclave. A ideia é aqui foi a de mitigar o risco de uma penhora ou constrição que prejudique suas finanças, antes mesmo da deliberação sobre o plano de recuperação judicial pelos credores que, em muitos casos, não poderá se realizar em virtude da política pública de combate à Covid-19.
Mesmo nos casos em que o plano de recuperação judicial já está aprovado e, consequentemente, em fase de cumprimento, o CNJ recomenda que a recuperanda poderá apresentar um plano modificativo, a ser submetido à nova AGC, desde que: (i) comprove que suas atividades e capacidade de cumprir suas obrigações foram afetadas pela crise da pandemia causada pela Covid-19; e (ii) desde que esteja adimplente com suas obrigações até 20.3.2020 – data em que foi declarado o estado de calamidade pública, através do Decreto Legislativo nº 6/2020.
De fato, essas condições se mostram coerentes com as regras do Código Civil sobre a isenção de responsabilidade do devedor em caso de força maior (art. 393 e 399) e sobre o nexo de causalidade entre o evento de força maior e o impedimento ou a dificuldade na realização das atividades.
Quando se tratar de pedido de convolação da recuperação judicial em falência, em virtude de inadimplemento das obrigações do plano durante o período da calamidade pública, o CNJ recomenda aos juízes que considerem, caso a caso, se o descumprimento do plano não poderia ser causado pelas medidas de distanciamento social e, assim, flexibilizar o disposto no artigo 73, inciso IV, da Lei nº 11.101/05, considerando a aplicação da força maior.
Já no que diz respeito aos administradores judiciais, é sugerido que mantenham a apresentação de relatório mensal de atividades da recuperanda, divulgando-os em seus sites, e se utilizando dos meios virtuais para realizar a respectiva fiscalização.
A última recomendação é dirigida a todos os juízes e não apenas àqueles “com competência para julgamento das ações de recuperação judicial e falências”. E sugerem que o magistrado avalie “com especial cautela” o deferimento de medidas de urgência, tais como decretação de despejo por falta de pagamento e a realização de atos executivos de natureza patrimonial, que demandem obrigações inadimplidas durante o estado de calamidade pública.
É salutar e oportuna a aprovação do CNJ quanto ao tema das empresas em recuperação judicial. Como se sabe, o instituto tem por objetivo a manutenção da empresa que tenha condições de permanecer gerando riquezas e contribuindo na manutenção de empregos.
Nesse momento delicado, deve-se cuidar não só para que empresas não precisem lançar mão de pedido de recuperação judicial, mas também adotar as medidas mais adequadas para que as sociedades que já se encontram nessa situação consigam de fato se recuperar.
Portanto, vai nesse sentido as seis recomendações do CNJ que buscam garantir a efetividade do procedimento de soerguimento de empresas, que já se encontravam em crise antes mesmo da pandemia, além de garantir o efetivo pagamento dos credores, de modo a permitir o aquecimento da economia.