A disputa pela exclusividade de uso da marca iPhone continua
Desde 2013, Apple e IGB Eletrônica (atual denominação da Gradiente – Gradiente/IGB) disputam o direito ao uso exclusivo da marca “Iphone” no Brasil.
Após todas as instâncias terem decidido em favor da Apple, o caso chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF), que vai analisar se o acórdão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) viola ou não os preceitos constitucionais da propriedade (art. 1º, IV, da Constituição Federal), da livre concorrência (art. 170, IV, da CF) e da legalidade (art. 5º, II, da CF).
Em resumo, a Gradiente fez o depósito da marca “Iphone” perante o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) no ano 2000, lançando, no mesmo ano, produto associado à marca. Posteriormente, em decorrência das dificuldades financeiras vivenciadas pela empresa, que inclusive a levaram a pedir sua recuperação extrajudicial, em 2007, esta deixou de produzir seu “IPhone”.
No mesmo ano de 2007, a Apple lançou seu primeiro “Iphone” no Brasil, e apenas no ano seguinte, em 2008, a marca foi concedida à Gradiente/IGB, sem nenhuma ressalva.
Pela Lei de Propriedade Industrial (LPI), o registro marcário garante a seu titular o uso exclusivo da marca (art. 129, LPI). Trata-se de um direito negativo, ou seja, um direito de impedir terceiros de se valerem de seu direito de propriedade.
Fato é que a Gradiente/IGB recuperou-se em 2012 e, na ocasião, o IPhone da Apple já era icônico, inclusive no Brasil. Ainda assim, a Gradiente/IGB retomou o uso de sua marca associada ao seu “IPhone Gradiente”, extirpando o risco de perda de seu direito por caducidade (art. 143, II, LPI).
Nesse cenário dúbio de a quem faz jus o melhor direito, a Apple abriu fogo contra a Gradiente/IGB, ajuizando, em 2013, ação de nulidade parcial do registro da marca “IPhone” concedido em favor desta última.
A ação é pautada, fundamentalmente, no dispositivo da LPI que veda a registrabilidade de signos “de caráter genérico, necessário, comum, vulgar” (art. 124, VI, LPI), tendo a Apple defendido que o termo IPhone, por ser a constrição de “I” – que remete a objetos com acesso à rede, e “Phone”, palavra inglesa para “telefone”, não poderia receber proteção.
Ainda, a Apple defendeu sua respeitabilidade e a inequívoca associação dos consumidores ao termo, já consagrado desde a comercialização de seu primeiro “IPod”, defendendo que o registro da marca não poderia ter sido concedido em favor da Gradiente/IGB sem o chamado “apostilamento”, ou seja, sem uma anotação que impedisse a exclusividade do termo “IPhone” usado isoladamente.
O TRF2, mantendo integralmente a sentença de procedência, registrou no acórdão que “No caso concreto, a expressão IPHONE guarda relação direta com os produtos da parte autora, consequentemente, a utilização do termo, isoladamente, por parte da Apelante, estaria induzindo o consumidor em erro sobre a natureza dos seus produtos, em desconformidade com a mens legis que rege a Lei 9.279/96”, o que justificaria a determinação de apostilamento “para a proibição da Gradiente/IGB “de se valer do termo “IPHONE”, de forma isolada, uma vez que este encontra-se estritamente vinculado, tanto no mercado nacional como no internacional, ao produtos da ora apelada Apple”.
Ainda, o Tribunal, pautando-se em preceitos da LPI que vedam a concorrência desleal, registrou que “permitir que a empresa Ré utilize a expressão IPHONE de uma forma livre, sem ressalvas, representaria imenso prejuízo para a Autora [Apple], pois toda fama e clientela do produto decorreram de seu nível de competência e grau de excelência. A pulverização da marca, neste momento, equivaleria a uma punição para aquele que desenvolveu e trabalhou pelo sucesso do produto. Logo, a Autarquia -ré ao analisar o pedido de registro da empresa Ré, jamais poderia ter desprezado a dimensão que o mercado do IPHONE tomou entre os anos de 2000 e 2008. 0 fato de o INPI ter demorado quase oito anos para concluir o processo administrativo, não lhe permite retroagir a situação fática da época do depósito, criando uma insegurança total para os envolvidos. A proteção à propriedade intelectual é importantíssima, mas não é um fim em si mesmo, principalmente quando tratamos de produtos e mercados aquecidos. Em suma, o deferimento do registro à empresa Ré tinha de ter observado a existência de concorrente no mercado, a inexistência do produto desta e, por fim, a evolução do mercado do IPHONE“.
Além disso, cabe mencionar que na sustentação oral perante o STJ, a advogada-geral da União – Grace Mendonça – defendeu que a marca “Iphone” pertence, de fato, à Gradiente, tendo em vista que a “Gradiente pediu o registro da marca em 2000, enquanto a Apple só viria a lançar o aparelho “iPhone” em 2007. A preocupação da AGU é no sentido de que sejam respeitados os procedimentos legais para o registro de marcas, os quais, inclusive, seguem os padrões globais e fazem parte de compromissos internacionais assumidos pelo Brasil”. No entanto, o STJ manteve o acórdão do TRF2.
Com esses acordes, a questão está entregue ao STF, para que a Corte enfrente se, ao assim decidir, o acórdão violou os preceitos constitucionais da legalidade, da propriedade e da livre concorrência.
Em paralelo, cabe mencionar que fora do Brasil a Apple perdeu disputas envolvendo a marca “IPhone”. No México, a disputa se deu com a empresa telefônica “iFone”, que havia registrado a sua marca em 2003, quatro anos antes do lançamento do primeiro iPhone nos Estados Unidos. Lá, foi a mexicana que venceu perante a Suprema Corte local, tendo o caso sido arquivado, após acordo envolvendo de indenização monetária e a Apple manteve, com isso, a venda de seus aparelhos no México.
Já na China a Apple foi malsucedida na disputa pela marca iPad, e essa derrota resultou no pagamento de US$ 60 milhões à empresa Proview.
De volta ao Brasil, quem sabe em breve chegaremos ao capítulo final desse embate da Gradiente e Apple.